Além das respostas
O webinar "Uma metamorfose da mente: cultivando movimento em nossas formas de ver e participar do mundo", conduzido por Cristiana Improta, explora uma transformação profunda na forma como percebemos e interagimos com o mundo. Cris, uma "artivista do pertencimento" e facilitadora de processos de transformação com mais de 30 anos de experiência, aprofunda-se na Fenomenologia Goetheana e no Pensamento Complexo, destacando a importância das relações, da vulnerabilidade e da aceitação do desconhecido. Este artigo sintetiza as ideias discutidas, propondo uma nova maneira de entender e participar dos sistemas complexos que nos cercam. Você também pode assistir ao episódio completo no final do artigo.
❝A vida é um emaranhado de sistemas dinâmicos que se influenciam e são influenciados por outros sistemas o tempo inteiro❞ – Cris Improta
A Fenomenologia Goetheana, desenvolvida a partir das ideias do filósofo alemão Johann Wolfgang von Goethe, propõe uma abordagem holística da observação. Em vez de dissecar e analisar as partes de um fenômeno isoladamente, essa perspectiva enfatiza a interação dinâmica entre o observador e o observado. No pensamento complexo, influenciado por teóricos como Edgar Morin, há uma valorização da interdependência e da mudança constante. Ambas as abordagens desafiam a visão mecanicista predominante, que trata o mundo como uma máquina composta por partes isoladas.
A diferença aqui é profunda, pois está na raiz da nossa cultura, um "caldo" no qual fomos criados e que ainda prevalece nas organizações e na sociedade, nos direcionando a perceber o mundo de maneira mecanicista, reducionista e hierárquica. Abordamos os fenômenos separando-os de seus contextos, analisando suas partes em detalhe, mas raramente as reconectamos ao todo. No entanto, sob a ótica da complexidade, partimos da totalidade. Nada existe em isolamento; tudo está inserido em contextos socio-históricos, onde vive, se desenvolve, influencia e é continuamente influenciado. Esta interação dinâmica é o que molda a existência e a evolução dos sistemas complexos, promovendo uma metamorfose tanto nos fenômenos quanto no próprio investigador.
O convite para as relações
Nos sistemas complexos, as relações entre as partes são fundamentais para a compreensão do comportamento emergente do sistema. Ao focar nas interações, e não apenas nos elementos individuais, podemos perceber como novas propriedades e comportamentos surgem dessas conexões. Isso é essencial para entender fenômenos naturais, sociais e organizacionais, onde mudanças em um elemento podem reverberar por toda a rede, influenciando o sistema em sua totalidade. ❝A vida acontece no entre❞
Do controle à interconectividade
A visão tradicional de controle é limitada em sistemas complexos devido à sua natureza imprevisível e em constante evolução. Tentativas de controlar ou prever cada parte do sistema geralmente falham porque desconsideram a complexidade e a interconexão inerentes. Uma abordagem baseada na interconectividade reconhece que cada componente do sistema afeta e é afetado uns aos outros. Isso requer uma mudança de mentalidade, abandonando a imposição da ordem para aceitar a fluidez, a adaptabilidade e a resiliência dos sistemas dinâmicos.
Ilhas de liberdade: criatividade e inovação através da exploração aberta
❝Muitas vezes eu toco bem. Poucas vezes eu faço música.❞
– Astor Piazzolla
Inovar requer uma abordagem que priorize a exploração e a descoberta, permitindo que o novo surja para além da busca por resultados imediatos. A pressão por respostas rápidas limita a criatividade. Cristiana apresenta o conceito de ilhas de liberdade como espaços intencionais de experimentação, onde conversas abertas e atenção às possibilidades substituem a demanda por eficiência. Esses espaços, variando de encontros informais a workshops e retiros estruturados, são essenciais para um engajamento profundo e para uma transformação criativa.
Como cultivar espaços de emergência criativa
Começar com uma intenção compartilhada: apesar de serem espaços de experimentação criativa, as ilhas de liberdade precisam de uma intenção orientadora. Ao contrário de objetivos rígidos ou métricas pré-definidas, a intenção compartilhada serve como uma bússola, proporcionando direção e alinhamento, sem restringir a liberdade criativa.
Priorizar o processo sobre o resultado final: valorizar o processo co-criativo e de aprendizado permite que ideias floresçam sem a pressão imediata de resultados, incentivando a exploração e a adaptação.
Abraçar a incerteza: adotar uma postura aberta diante do desconhecido, considerando a incerteza como um estímulo para novos insights e criatividade, em vez de uma ameaça.
Praticar atenção profunda, desenvolvendo uma atenção cuidadosa, estando verdadeiramente presente para perceber padrões sutis e conexões, o que facilita a geração de novas ideias.
Reconhecer "erros" como oportunidades: ver os erros como etapas de aprendizado essenciais, que amadurecem o processo de inovação contínua, gerando sabedoria e inteligência coletiva.
A vulnerabilidade como caminho para um engajamento profundo
❝O mundo todo está dando respostas. O que demora é o tempo das perguntas.❞
– José Saramago
A vulnerabilidade, frequentemente vista como fraqueza, é, entretanto, uma poderosa fonte de conexão humana. Quando permitimos que nossas experiências e as influências dos outros nos afetem positivamente, abrimos espaço para diálogos genuínos e resolução colaborativa de problemas. Em ambientes organizacionais, onde o controle e a certeza são valorizados, a vulnerabilidade pode parecer arriscada. Porém, ao aceitar o desconforto e expandir nossa tolerância à incerteza, criamos condições para um aprendizado mais profundo e conexões mais significativas, essenciais para a inovação e adaptação.
O poder do "não saber" para a criatividade
Abraçar o "não saber" é crucial para a inovação em sistemas complexos. Isso envolve suspender nossas certezas e estar abertos a novas informações e possibilidades inesperadas. Três práticas-chave para cultivar essa capacidade são:
Relaxar o foco: em vez de focar estritamente, adotar uma percepção mais ampla permite que insights inesperados surjam.
Fazer perguntas geradoras: em vez de buscar respostas definitivas, fazer perguntas abertas que convidam a múltiplas perspectivas e desafiam suposições.
Honrar o espaço "entre": as soluções mais inovadoras muitas vezes emergem nos espaços entre diferentes disciplinas e modos de pensar.
Aceitando a ambiguidade como potência geradora
❝Ninguém educa ninguém, ninguém educa a si mesmo, os homens se educam entre si, mediatizados pelo mundo.❞
– Paulo Freire
Abraçar a ambiguidade é essencial em um mundo de constante mudança e incerteza. Reconhecer que sistemas complexos são inerentemente imprevisíveis e dinâmicos nos ajuda a lidar com a incerteza de maneira produtiva. Cris também compartilha algumas práticas chave nesta seara:
Honrar perspectivas diversas: criar ambientes onde diferentes pontos de vista são respeitados e incentivados é essencial para a inovação. Espaços seguros para compartilhar e discutir sobre diferentes ideias promovem um diálogo rico e produtivo.
Consciência expandida: a ambiguidade nos desafia a olhar além de nossos modelos mentais existentes, considerando pontos de vista divergentes ou complementares e ampliando nosso campo de visão.
Adaptabilidade: a habilidade de navegar pela ambiguidade com resiliência e criatividade é vital para indivíduos e organizações. Em vez de lutar contra a incerteza, devemos aprender a usá-la como uma oportunidade para crescer e evoluir.
Reivindicando nossa interconectividade — da separação à participação
A visão de separação entre o ser humano e o mundo natural tem sido predominante, particularmente desde a Revolução Científica e a era do Iluminismo. Tal perspectiva nos levou ao desenvolvimento de uma cultura onde as relações são muitas vezes ignoradas em favor de uma análise focada nas partes. No entanto, essa visão separatista é uma ilusão, a qual desconsidera a interdependência fundamental de todos os sistemas de vida. Compreender a interconectividade de toda a vida é essencial para mudar nossa abordagem em relação ao meio ambiente, às comunidades e à própria existência.
Uma transformação genuína somente ocorre quando abandonamos a mentalidade de separação e nos engajamos ativamente com os sistemas dos quais fazemos parte. A participação ativa significa reconhecer nossa agência em moldar o mundo ao nosso redor e a importância de se envolver de forma colaborativa na resolução de problemas complexos. Isso envolve não só a participação física, mas também a emocional e intelectual, reconhecendo que cada ação afeta o conjunto. Participar significa co-criar soluções que são sistêmicas e sustentáveis, incorporando a sabedoria coletiva e a diversidade de perspectivas.
Convidamos você a refletir sobre como esses princípios abordados no webinar podem ser aplicados na sua vida pessoal e profissional. Comece criando espaços para diálogos abertos, nos quais as perguntas sejam mais valorizadas do que as respostas definitivas. Pratique a escuta ativa e esteja disposto a desafiar suas suposições. Busque adotar uma mentalidade de aprendizado contínuo, abraçando a incerteza como uma oportunidade para crescimento e transformação. Juntos, podemos co-criar um futuro mais regenerativo e sustentável, onde a inovação e a empatia caminham de mãos dadas.
Assista ao episódio completo de Uma metamorfose da mente, com Cristiana Improta:
Cris se define como "artivista do pertencimento", facilitadora de processos de transformação pessoal e organizacional, com vivência de mais de 30 anos em consultorias estratégicas, é também criadora da abordagem Organic Coaching. Possui uma rica experiência em campos como Sustentabilidade, Sistemas Regenerativos, Pensamento Complexo e Fenomenologia Goetheana, além de ser amante das artes e da poesia. Em suas ideias e reflexões, Cris nos convida a uma abordagem filosófica e integradora da complexidade sistêmica aos contextos organizacional, social e ambiental.